Meninos sem pátria de Luiz Puntel seria mesmo de doutrinação comunista?



Por: Allan de Oliveira.
 

 

Abaixo você poderá assistir a um vídeo sobre o assunto:


 


Introdução

Quando li pela primeira vez “Meninos sem pátria” foi em 1994, época que eu cursava a 6ª série do Ensino Fundamental por ter sido exigido por uma professora de Língua Portuguesa do colégio do qual estudei. Lembro que naquele tempo eu ainda não tinha o gosto pela leitura e, somente, em 1996 quando fiz uma segunda leitura do livro foi quando acabei me envolvendo com a estória.

Lembro-me também de ter me comovido com a fuga da família para a Bolívia, depois para o Chile, até ela ser acolhida pelo governo francês em 1973, e também pelo fato de Marcão (o narrador-personagem) ter se separado da sua namorada Claire o que me deixou ainda mais triste. Foi quando passei a considerar essa obra uma das maiores que li em minha vida.

Em 2018, quando circulou uma notícia sobre o livro ter sido censurado por alguns pais de alunos num colégio do Rio de Janeiro pelo fato de estarmos passando por um momento conturbado no Brasil, resolvi ler novamente a obra e fazer um resumo para o presente blog.

Em relação à censura do livro, isso ocorreu por certa afirmação desses pais considerarem a obra como de “doutrinação comunista”. Provavelmente, os mesmos não entendem sobre a significação da “doutrina” ou tão pouco se deram ao trabalho de lerem o texto do início intitulado “- Com licença, posso entrar?” onde o autor deixa claro na página 9 sobre as ditaduras de Esquerda e de Direita, mostrando claramente que sua obra não é de doutrinação comunista, pois se fosse será que ele citaria uma ditadura de Esquerda como consta no parágrafo da página 9 que está logo abaixo?

“Quando foram publicados Deus me Livre! e Açúcar Amargo, por esta mesma editora, estive em muitas escolas, conversando com os alunos, falando sobre essa necessidade fisiológica que é o escrever. Deparei com as mesmas carinhas de espanto e medo. E agora não eram apenas brasileiros, mas nicaraguenses, argentinos, uruguaios, chilenos, vietnamitas, todos fugindo de golpes de esquerda e de direita, indistintamente”. (PUNTEL, p. 9)

Outro exemplo de que a obra “Meninos sem pátria” não faz doutrinação “comunista” é o patriotismo sentido pelos personagens por eles sentirem saudades do Brasil, ou seja, terem um grande sentimento de nostalgia por sua pátria. Como também podemos ver na página 114 quando Marcão e seus colegas brasileiros exilados na França fazem uma apresentação no colégio do qual estudavam sobre como era o Brasil:

“Eu estava tenso, ao ver que ficara sozinho e agora, a data de nossa independência. É certo que ainda está longe, já que o nosso 14 Juliet acontece no dia 7 de setembro, e nós ainda estamos em maio. Mas não faz mal. Há muito tempo nós não temos podido comemorar essa data...

O silêncio que todos faziam, de olhos fixos em mim, deu-me confiança, chegando a emocionar-me.

- Mas, como vocês sabem, estamos proibidos de pisar em solo brasileiro. Muitos de nós, para ser franco, acho que nunca comemoramos o 7 de setembro. Muitos de nós temos vivido sempre fugindo de país em país, como se fôssemos bandidos perigosos. Por isso, quero agradecer a Monsier Fauré a oportunidade que ele nos deu, de aprendermos, com esta atividade, muitas coisas sobre nosso país, sobre nossa pátria”. (PUNTEL, p. 114).

Esse trecho deixa claramente a ideia de patriotismo existente no livro já que a ideia comunista/socialista é internacionalista (a pátria é o mundo e não um país), como podemos ver isso claramente expresso no Manifesto Comunista de Karl Marx e Friedrich Engels que termina com a célebre frase: “Proletários de todos os países, uni-vos”.

Para quem conhece um pouco de história do Brasil, principalmente, a época do Regime Militar e sobre a Ditadura de Pinochet no Chile, fica bem mais fácil compreender a obra “Meninos sem pátria”, porque um pouco desse conhecimento irá ajudar o leitor a fazer uma leitura prazerosa. Porém, como não pretendo focar apenas nesta modesta introdução ou tão pouco deixar o texto do blog muito longo para não cansar o leitor que, provavelmente, estará lendo em um smathphone, vamos ao resumo do livro.

Resumo

Narrado em 1ª pessoa, o livro “Meninos Sem Pátria” de Luiz Puntel, lançado pela Editora Ática, é narrado por Marcão e se inicia na cidade de Canaviápolis/SP quando o pai dele, o jornalista Zé Maria, certo dia chega à sua casa e conta à esposa Tererê que o jornal do qual trabalhava foi arrombado por militares por causa do seu artigo publicado sobre a tortura do Padre Mauro. Esse fato ocorreu porque para o Regime Militar o seu artigo foi considerado subversivo. A história se passa nos anos 70 e termina no tempo da Anistia do presidente João Figueiredo em 1979. Com isso, um homem misterioso avisa o garoto Marcão para esse dar um recado ao seu pai a respeito do artigo e para não ser publicado mais nada daquele porte. Depois, Marcão e o próprio Zé Maria recebem ameaças por telefone.

Dias depois, o prédio do qual a família morava estava cercado. A sorte foi ter aparecido um vendedor de gás. Quando esse entra no apartamento, Zé Maria aponta um revólver para o recém-chegado, ordenando-o a tirar a roupa para ele mesmo vestir e fugir disfarçado de vendedor de gás. Após esse episódio, Tererê prestou alguns depoimentos na delegacia e um cabo da polícia deu ordem de prisão aos motoristas de gás a fim de encontrar Zé Maria.

A família passa a ser seguida. Os dias passam e Tererê (que está grávida de Pablo), juntamente com os dois filhos recebem notícias onde Zé Maria se encontrava. Assim, eles vão passar uns dias em um convento em Ribeirão Preto/SP onde são ajudados por freiras e por um padre até seguirem para Campo Grande/MS e fugirem para a Bolívia para se encontrar com Zé Maria.

Depois da Bolívia a família partiu para o Chile e lá nasceu outro filho do casal, Pablo. No Chile eles permanecem até 1973, quando estoura a Ditadura de Pinochet. É quando a família teve novamente de fugir, indo morar na França.

No país da Torre Eiffel, os garotos foram estudar num colégio, enquanto o pai trabalhava como jornalista freelancer do Le Monde e a mãe estava grávida do 4º filho.

Marcão faz amizades com garotos franceses e alguns exilados do Brasil e conhece o amor da sua vida: Claire.

Zé Maria continua a publicar artigos sobre o Regime Militar no Brasil e novamente recebe telefonemas ameaçadores, bem como homens que vigiavam sua casa, os seus passos e os da sua família. Até certa vez Zé Maria precisar se esconder e andar disfarçado.

O tempo passa e em 1979, o presidente João Figueiredo assina a Lei de Anistia. A família de Marcão estava alegre e ansiosa para retornar ao Brasil. Marcão também se sentia dessa forma, porém, ele teria de deixar sua namorada Claire e seus amigos lá na França. E no dia do regresso, alguns repórteres entrevistaram os exilados brasileiros e o livro termina com Claire chorando ao lado de Pierre (amigo de Marcão) que se despediam.

Conclusão

Seria mesmo a obra “Meninos sem pátria” de Luiz Puntel um livro que aborda “doutrinação comunista?” E o que seria Comunismo? Pelo que se entende Comunismo é um sistema social que visa o “bem comum a todos”. Ou seja, tudo é de todos, e todos seriam iguais. No sistema social não haveria classes sociais, nem ricos, nem pobres, ou tão pouco um governo, como também é defendido pelo Anarquismo. E de acordo com os filósofos Karl Marx e Friedrich Engels para chegar a esse sistema seria preciso haver a fase de transição chamada de Socialismo quando o Estado se apropria de todos os bens e a propriedade privada é extinta. E se fomos colocar como exemplos os países que adotaram o Socialismo como a Ex-União Soviética e até mesmo a China nunca existiu Comunismo no mundo porque o Estado era centralizador e ditatorial e jamais ele chegou à fase comunista porque como diz a famosa frase de Abraham Lincoln “Se quiser por à prova o caráter de um homem, dê-lhe poder”.

Para quem não compreende a doutrina Comunista (deixando claro que esse que vos escreve não é comunista) e vai pelo que a mídia e muitos desinformados andaram dizendo por aí por muitos anos, pela lógica, nunca houve no mundo um país Comunista. O que existiu realmente foi um sistema Stalinista. Sendo assim, por acaso a obra “Meninos sem pátria” de Luiz Puntel defende algumas dessas ideias? Seja, Stalinista, Socialista Autoritária, ou Comunista? Tenho absoluta certeza que não. O que ela defende realmente é que os protagonistas sentem saudades do Brasil fazendo jus ao título do livro. Portanto, não podemos julgar um livro pela capa, mas lê-lo, estudar as supostas doutrinas para depois fazer uma crítica. 

 

Abaixo você poderá assistir a um vídeo sobre o assunto:




 




Gosta de literatura? Aproveite para fazer parte do grupo do Facebook “Literatura, Artes e História” cujo objetivo é postar um acervo de obras ligadas à literatura, contextualizando com a história e às artes, como uma espécie de biblioteca digital com o intuito de preservação da cultura humana: https://www.facebook.com/groups/593431297428422/

Obrigado pela visita.


REFERÊNCIA:

PUNTEL, Luiz. Meninos sem pátria. 13ª ed. São Paulo, Editora Ática S.A., 1992.

Literatura TV

Escritor, pesquisador, blogueiro, e Youtuber que visa através deste blog a circulação de textos próprios, bem como o de pessoas amigas, no intuito de incentivar as artes que há dentro de cada um de nós, e também a divulgação de culturas em geral. Contato: contatoallandeoliveira@gmail.com

Postar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem
As Mil e Uma Noites: Lições valiosas para a humanidade